domingo, 16 de junho de 2019

BAIRRO PERIFÉRICO


O sol se pondo, a tarde morna,
os operários e suas mochilas.
Ladeiras, ruas, vilelas,
mulheres de curtos vestidos,
decotes protuberantes.

Crianças brincando em calçadas,
poema quente ao crepúsculo.
Os homens, mulheres chegando
e entrando em casas pequenas,
despindo as vestes suadas.

Vai caindo a noite, quase festiva.
Os homens apertam as mulheres,
e estas se dão, sequiosas.
Suor, o sêmen, os fluidos,
verão acendendo os desejos:
quão linda é a magia do sexo!

Conversas, os risos, as mesas,
a dança dos copos nos bares.
Tevês, novelas, notícias,
queixumes, atrito nas casas.

Existe a tensão n'alguns becos
onde homens suspeitos conversam
e quase nunca sorriem, 
e o bairro lhes é como um servo.

A Lua, redonda, bonita,
reluz sobre as casas e bares,
prateia os telhados e muros,
atiça a alegria da gente
e é um canto lotado de vida.


sexta-feira, 17 de maio de 2019

A NOITE EM DUAS FACES

Vejo a noite da janela,
as mulheres caminhando
com seus trajes sedutores.

Eu, já velho, avisto a noite
como à lua tão distante.

Mas eu velho, mas que velho?
Que velhice que me assola?
Tenho pulsos, tenho anseios,
mas idade, não, jamais.

Quero a noite e seus pecados,
nessa noite me atirar.
Porém, sei que a noite é puta,
não a puta que eu respeito, 
por querer ganhar seu pão.

Não, a noite é meliante,
é rameira perigosa,
é sereia e é valquíria,
é uma ninfa tão mortal...

Mas que importa, se ela é ninfa?
Pois com ninfas já vivi.
E livrei-me todavia
do feitiço inebriante
com que as pérfidas satânicas
me enlaçaram nos seus braços.

Mas também a noite pode
ser doçura comovida,
se alguns olhos nos seus entram,
traduzindo acordes brandos
e o vulcão do coração.

Da janela fito a noite,
que é feroz e que é serena,
meretriz afeita ao crime,
que é uma amante apaixonada.

Ai, a noite e suas faces,
qual moeda para apostas.
Ganho ou perco nesse jogo?
Mas que noite a que me espera?