domingo, 29 de janeiro de 2012

É PRECISO

É preciso falar da pureza das relvas e dos campos.
É preciso falar da leveza dos arbustos balançando,
Da poesia dos casais se amando ao luar.

É preciso notar que é simplesmente magnífico
Os gatos a se deleitar do sol de outono
E os cães se espreguiçando de papo pro ar.

É preciso evocar momentos belos do cinema
E os trechos mais tocantes dos romances que já lemos
E as canções mais comoventes que escutamos.

É preciso não nutrir a chã ganância,
Que alimenta as guerras e a miséria.
É preciso não lembrar que a engrenagem
Faz que os homens sejam sempre oponentes
E mister aniquilar um semelhante a cada dia.

É preciso vislumbrar o fim da tarde
Da janela fechada aos sentimentos.
É preciso ser humano como professado pelos místicos,
Não da forma cruel e peculiar do dia-a-dia.

2012

TRISTEZA

Não me venha a esperança querer acender.
Não venha a alegria das ruas querer me tentar.
Não venha o sorriso da moça tentar me assanhar.
Minha alma é pálida e quase inerte,
Não tem sinais vitais e está envolta num manto de tristeza.

Hoje pela manhã um fio de sol entrou no meu quarto fechado
E tentou inutilmente me lembrar da vida lá fora.
Eu não canto nem me deslumbro, apenas sigo em meu passo
                                                                     [ arrastado.
A minha alma é que aliás tem o passo arrastado!
E sofre de uma fadiga incurável, sem tamanho.
Meu olhar cansado bate sobre o mundo
E as coisas
Numa desilusão desoladora e tão perversa...
O mundo segue, eu vejo, impassível, tão imóvel,
Como pedra que em si não sente o mar bater.

2012                      

MELANCOLIA II

Não ruminar a dor e tirar os olhos de dentro da escuridão da alma.
Debruçar-se à janela e voltar os olhos para a vida lá fora,
Atirar-se na vida que existe lá fora...
Atirar-se na vida que existe lá fora...
Mas como, se não há vida lá fora,
Como não há vida nas ruas, na cidade, no país,
E o mundo se tornou um deserto imensurável,
E as assombrações vagueiam tristemente por todo lugar,
Num silêncio tão noturno e tumular?
Como, se a noite que cobre o peito magoado
Se expandiu no universo por inteiro,
E o dia parece que não mais se acenderá?

Como, se os ventos lamentosos percorrem os desertos incontáveis,
E não há voz nem som de um instrumento
Que traga à quietude alguma poesia?

Como, se a morte se apossou da alma,
Se a alma se apagou de sombras,
E as assombrações, assustadoras,
Vagueiam, senhoras da tristeza e do medo,
No seu macambúzio semblante de morte?

2012

sábado, 21 de janeiro de 2012

A MULHER DO AMIGO

A mulher do amigo
tem olhos tão lânguidos,
malícia no riso,
o rosto tão belo.

A mulher do amigo
tem voz de menina,
cativa o olhar
do amigo sozinho.

A mulher do amigo
tem coxas roliças,
tem seios protusos,
é ninfa no bar.

A mulher do amigo
atrai fantasias,
atiça os desejos
do amigo sem par.

A mulher do amigo
faria infiel
o amigo sozinho,
sedento de tê-la.

A mulher do amigo,
primeira entre todas,
paixão por momentos,
fugaz devoção.

2012      

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

FESTIM DA VOLTA


Dourei de sol minha manhã,
Embora houvesse chuva fina.
Enchi de amor minha canção,
Me  fiz mais terna mansidão,
Tornei-me doce poesia,
Para aguardar você voltar.

Reli poemas tão bonitos,
Enchi meu peito de alegria,
Cheirei profundo o vento leve,
Enchendo a alma então de brisa,
Ornei meu peito de paixão,
Para aguardar você voltar.

Deixei o vinho sobre a mesa,
Pus a tocar mil melodias,
Me fiz devoto aos sons mais belos,
Pintei a casa de poema,
Tornei-me orquestra de alegria,
Para aguardar  você voltar.

Guardei um verbo tão macio,
Abri meus braços para a vida
Me fiz tão uno co’o lirismo,
Lhe fiz uns versos de paixão
Tão parecidos co’oração,
Para aguardar você voltar...

2012

sábado, 14 de janeiro de 2012

PRECE DO POETA

Vem, meu verso, e faze meu poema encantado e tão bonito,
Que eu me torne um eterno emissário dos deuses comovidos
     [ a propalar ternuras pelos quatro cantos do Universo.
Faze que eu emocione o coração mais rijo e que meu verbo seja doce e leve
                                                      [ como brisa matutina.
Faze o meu escrito radiante e tão viçoso qual menina adolescente com seus
                                                       [ sonhos e desejos juvenis.
Faze que o lirismo torne a mim e os outros homens elevados e  cientes
                                       [ de que somos unos com o cosmo.
Torna então meu canto o elemento que aos humanos faça entregues aos mais
                                                  [ altos sentimentos,
Ao pensar profundo que nos leve à visão mais cristalina sobre as coisas.
Faze enfim, meu verso, ser a poesia o ponto onde se encontre o físico e o
                                          [ controverso metafísico
E, mais, que descubramos a completa unicidade entre os dois.

2011

domingo, 1 de janeiro de 2012

VIVER POESIA

Não quero mais a alegria
Dos seus olhos tão cheios de tarde,
Quero os olhos de noite daquela
Que tem mavioso lirismo
E, assim, me comove tão fundo,
Que eu quero sorver sua paz,
Viver comunhão, harmonia
E ser poesia igualmente.

VIGÍLIA

Se hoje eu ficar insone,
Serei sentinela da noite,
Farei  vigília ao teu sono,
Cheirando-te a  pele macia.

E, quando chegar o dia,
Teus olhos me encontrarão desperto,
Na alegria daqueles que vivem
A aurora de um tempo sublime.

TÉDIO

Dias iguais, pessoas, carros e panoramas quase iguais.
Tudo é igual na igualdade dos dias,
Como se os dias fossem um único dia,
Fragmentado em pedaços com a mesmíssima feição.

O tédio...ah, o tédio(!), o intragável tédio!
O que fazer da vida então?
Despirmo-nos das roupas e mandarmos às favas os compromissos,
Os preceitos e o razoável senso do praticável,
Copularmos nos logradouros mais impróprios, ante a perplexidade
[ e a indignação dos mais contidos?

O que fazer então da vida?
Deixar que o mundo se dane
E apenas ouvir as vozes mais belas e os instrumentos mais lindos
Em melodias encantadoras?

Viver os delírios mais absurdos,
Fazer da loucura o caminho,
Deixando este mundo à deriva
Simplesmeente?

O que fazer então da vida?
Apenas tragar o tédio,
Tragar o tédio intragável
E aguardar as surpresas dos dias
No afã de que sejam boas,
Viver a incerteza dos dias
Na expectativa de puros infantes
Contando com belos presentes.

2011