quinta-feira, 9 de outubro de 2014

VERSOS DE ODIENTA MÁGOA

Quando a solidão tocar em tua alma os dedos gélidos,
mas gélidos de arrepiar a carne e provocar gemidos,
encolhe-te apenas e aperta o próprio corpo nos teus braços:
não penses em momento algum chamar por mim.

Quando a solidão apertar tua garganta
com o vigor de assassina impiedosa,
sente apenas o ar faltar e a agonia:
não clames que eu te venha socorrer.

Quando a solidão doer de forma intensa,
mas intensa como a dor mais lancinante
ou de carne perfurada devagar por lança,
vive e sofre infinitamente esse momento:
não contes com que eu surja para ser o teu alívio.

Quando quiseres recostar e recosto não houver
quando quiseres chorar e um ombro inexistir,
quando quiseres pisar e o chão não encontrares,
deixe vir as lágrimas, abundantes e sem fim,
cai em ti, reflete e reconhece:
tu que para todo o sempre me perdeste.

ALÉM DO FIM DO MUNDO

Um último som se ouviu
no ermo,
um tímido som,
vibração tão breve,
um quase nada...
uma nota
talvez
- quem sabe?


Um som - seria?
Talvez mera impressão,
talvez alucinação,
equívoco,
então nada.

Lugar remoto, cinzento,
sombrio,
sem planta nem flores,
sem rios,
sem sons e sem cores,
sem sol, sem nada.

Uma voz talvez cante.
Mentira!
Não canta.
É tudo
deserto,
é tudo
silêncio
profundo
de tumba...
de tumba.

Apenas o vento brando
levanta
de leve
a terra
cinzenta
do chão
estéril,
no ermo,
no vago,
remoto
lugar
que fica
além
do fim...
do fim
do mundo.


OS QUERUBINS

O artista canta, o artista toca,
eu apenas ouço
arrebatado, enfeitiçado,
fascinado pelos sons miraculosos.
Quem canta, vive mais perto de Deus,
e eu, mero homenzinho, fecho os olhos,
deixo que invadam meu coração
essas sublimes melodias desses querubins sublimes.

sábado, 27 de setembro de 2014

ARTE DE AMAR

A pele branca e a pele negra numa febre da volúpia mágica,
A pele negra e a pele branca encharcadas do suor do cio humano,
A pele branca e a pele negra numa amálgama divina,
A pele negra e pele branca semeando mulatice,
A pele branca e a pele negra num fervor angelical.
Gemidos brancos, ais tão negros, vozes unas e mestiças,
Um corpo só, uma alma única, um gozo na grandeza absoluta.
Salvai, ó Deus, a alta harmonia dessas peles que se roçam na transcendental arte de amar.

sábado, 20 de setembro de 2014

VERSOS QUIXOTESCOS

Não me importa a que distância está de mim,
Não importa a condição civil que tem:
Tenho o mar pra lhe mostar em minha terra
E um poema enamorado que lhe fiz.

Não remoa as mágoas vindas do passado
Nem o ódio se este pulsa em suas veias,
Se a canção que lhe dedico é tão bonita
E cantada numa voz angelical.

Não permita que a dor  rasgue esse seu peito,
Se o seus olhos tão vivazes me fascinam
E a beleza do seu rosto engimático
Faz que eu queira desvendá-la por inteiro.

Faço versos tão singelos pra afagá-la,
Poesias que traduzem que me atiro
À loucura deste intenso sentimento
De uma forma juvenil, trascendental.

Tenho sóis, luares, praças pra mostrar,
Tenho luzes de artifício em noites belas
E uma cama como feita pro seu corpo,
E um amor maior que eu mesmo pra lhe dar.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

TRISTE, AO LÉU

Os versos que me vêm co'a noite são tristonhos,

O rosto que no espelho vejo é macambúzio,
Os sons que vêm das ruas me parecem melancólicos.
De onde, Deus, me veio o gosto amargo das palavras?
Não te creio, Deus, nem amo ou te suplico
E por isto não me atiro em prantos nos teus braços:
Sigo a vida só catando as parcas forças do meu ser.
Mas pergunto: de onde veio esta tristeza que me corta,
Que me sangra e deixa rastros das feridas no caminho?
Em que esquina me perdi, me fiz sem rumo,
Nada mais que um ser errante, tão sem norte e direção?
Ser confuso, tão pequeno, tão perdido e tão ao léu.
Que esperança pode vir de um trecho inesperado
Desta estrada tão sombria e conturbada que percorro,
Qual levado por um vento que conduz somente ao nada?

sábado, 23 de agosto de 2014

LOUVOR AO PECADO

Hoje farei apologia ao pecado.
Não ao pecado dos perversos de toda ordem.
Mas ao pecado dos casais espúrios e nascidos de uma bulinagem inesperada e [inconsequente,
Dos lascivos e sensuais sem limites, de Adão e Eva provando do fruto proibido, de 
[Dioníso em suas festas licenciosas e Zeus em sua infidelidade peculiar.
O pecado das mais ousadas libertinagens, das mulheres que driblam maridos e se dão a [amantes eventuais ou costumeiros.
O pecado das mais desregradas esbórnias e das mais luxuriosas orgias.
Quero exaltar os devassos de todas as estirpes e os irreverentes de toda natureza, os [amantes desconhecidos que se dão imediatamente após um breve olhar.
Serei prosélito dos sensuais incorrigíveis, 
Dos que se amam pelos becos, pelas ruas escuras e os jardins das casas, das 
[praças, 
[das igrejas, deixando em seu rastro um cheiro inconfundível de 
[lubricidade.
Não farei louvações a santos ou a anjos bíblicos, muito menos aos profetas defensores 
[da virtude e devoção religiosa:
Quero apenas professar o pecado... o pecado... acima de todas as coisas o pecado: nada, nada além do delicioso pecado.


quinta-feira, 21 de agosto de 2014

VENHA

Não me deixe só,  minha bonita,
se a noite se despiu da poesia,
se é deserta e se vestiu de puro tédio, 
e se  tudo à volta é tão vazio
e entedia a alma mais intensa.

Venha, surja como bela mdelodia
que rompe o silêncio de repente,
surpreende o peito mais tristonho,
traz consigo claridade ensolarada,
faz pulsar as veias dos sem-vida.

Venha assim qual sonho de criança,
tão repleto de alegrias e delícias.
Chegue assim qual céu todo estrelado
enfeitando meu momento e minha noite,
como nada  houvesse mais a desejar.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

IMAGENS REFLETIDAS

Que enigma esconde esse teu rosto
num semblante perene de quem brinca
e se ri do mundo tão injusto e caricato?

Se os segredos não desvendo,
te conheço a sede, a sanha,
quanto ardem teus desejos
e me vejo um tanto pasmo,
absorto, até encantado
em notar de ti brotando
vida, ardor em profusão.

Quais quimeras te incendeiam?
Quais loucuras tu desejas?
Que aventuras te fascinam
nessa alma irrequieta?

Encantado, te contemplo,
porque entendo que há em ti
o quem em mim sinto brincando
desde os tempos mais remotos.

Quanto tens de mim em ti?
O que somos? Semelhanças
abundantes, incontáveis?
Ou então, se nos olhamos,
O que vemos? Um espelho?

Tua alma dança em mim?
Minha alma dança em ti?

Assim somos um só ser,
divididos e libertos
a voar pelo universo.

sábado, 5 de julho de 2014

VIDA A DOIS


ELA:
Nunca mais tocou a música
que enfeitava nossas horas
de carícias e volúpias
e de juras amorosas.

ELE:
Esse som não dá mais nada,
e a canção já deu no saco.
Onde encontro a calça preta, 
pr'eu sair pra trabalhar?

ELA:
Nunca mais me deu o abraço
ardoroso e matutino
entre frases de doçura, 
entre afagos sensuais.

ELE:
Corro tanto nesta vida
e concorro mais ainda,
que o mercado é tão perverso,
meu patrão, eu nem te conto.

ELA:

Quando chega, nem um beijo,
uma flor ou chocolate.
Nem um verbo de lascívia,
a menor das bulinagens.

ELE:
Ah, que trânsito maldito
com sinais tão numerosos,
com buzinas e fumaça,
cruzamentos tão travados!

ELA:
E a tsunâmi de outros tempos
entre colchas, travesseiros?
Ai, desejos tão de fogo!
Me sentia tão devassa...

ELE:
Eu prometo  noite dessas
me portar como um tarado,
garanhão enlouquecido,
destilar testosterona.

ELA:
Me promete que na sexta
você nada se aborrece
se mamãe dormir conosco,
lá no quarto, co'as crianças.

ELE:
Mas é claro, não me queixo.
Nesse dia jogo à noite
e só volto manhãzinha
do churrasco co'os amigos.

ELA:
Como é bom ser sua esposa!
Sem você este mundo é nada.
ELE:
Só você me faz dos homens
do planeta o mais feliz.



quarta-feira, 11 de junho de 2014

DIA DOS NAMORADOS


DIA DOS NAMORADOS

Dia dos Namorados: hoje então
Beijarei com a sanha dos sedentos
Amarei num fervor de ser selvagem,
Gozarei num sentir assim lunático
De o verbo não ter como revelar.

Me darei como nada mais houvera,
Co'a ternura dos entes sacrossantos,
Co'a doçura dos ventos mais suaves
E a leveza dos mais belos madrigais.

Me farei quixotesco, devotado
Como herói que se agarra a causa nobre,
Vou ser fogo, poesia, céu, pureza,
Vou viver neste dia só de amor.



domingo, 11 de maio de 2014

TANTO PAI (CONVERSA ALIENADA)

Vem, m'ermão, beber a nossa cervejinha:
afinal tá tudo certo, e o futuro, garantido:
Deus vai dar todo bem que precisamos
e até mesmo o que não sabemos precisar,

Se rezamos de noite todo dia,
se pecamos muito pouco pra cristãos.

Fique de olho na eleição pra presidente,
pra votarmos no pai mais indicado
e depois nos deitarmos na poltrona,
e deixar que ele trabalhe pra nós todos.

Ô, que vida mais gostosa a vida nossa!
É rezar e votar, depois mais nada,
pra depois colher os frutos merecidos.

Companheiro, veja, o Mengo tá danado!
Carnaval dá Portela com certeza.
Essa noite ouvi um pagode que é uma graça,
fala em bunda  putaria o tempo todo.

A novela me prendeu em casa à noite.
BBB já não sei mais quem que ganha.
Pro Governo do Estado aquele moço.
Não demora a gente volta pra prefeito:
como é bom quando temos tanto pai!

A mulher do Jacinto é uma baiaca,
mas a filha, meu Deus(!), é muito boa(!)
e corneia o marido de montão.
Minha sogra já tá lá pelas tabelas,
meu cunhado, se não erro, come vara.

Deus escreve correto em linhas tortas.
O prefeito só precisa ser festeiro.
Eu adoro de graça esse do Estado.
Presidente que graceja é muito bom.
Ê, Meu Deus, como é bom ter tanto pai!



domingo, 16 de fevereiro de 2014

LIVRE PARA SOFRER

Ficarei tão só, que os dias serão como derradeiros,
que a casa, de tão triste, mais parecerá assombrada,
que  as horas pesarão nos ombros como fossem grandes fardos,
que os momentos serão tediosos como segundas-feiras
e o desejo de viver será débil como um triste moribundo,
e o meu coração se aquietará tal como um mausoléu.
Serei triste como as fazendas em noite sem luar.
Levo contudo a certeza que não sou posse de ninguém,
de que sou livre pra viver e pra me aventurar,
de que estou bem solto para sofrer, me machucar.

2014