sábado, 30 de dezembro de 2023

ONDA

 Que coisa é essa que vibra no meu peito?

Seria um grito, música, agonia;

Seria arroubo, afã, fogo de vida?

O que brinca assim na minha alma

Tão baça, pálida, obscura?

Seria uma cantiga que vencesse o tempo,

O siso, os desencantos e a fadiga,

As agruras, os percalços e as vivências,

E se instalasse em mim qual flor no árido?

O que será que dói, que canta ou que extasia,

Ou que tortura ou desvanece e não decifro?

Mas que onda é essa que vem, rebenta assim de súbito

Na calmaria  quase que imóvel deste meu mar

Assim tão quedo, na linha do equador?

quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

HOMEM DE FERRO E CIMENTO

 Quem não se encanta com sons de uma canção

Nem se rende a um olhar angelical de um animal...

Quem não se enleva em contemplar as verdes matas

Ou ver o mar a tocar o céu bem no horizonte...

Quem não delira nas paixões mais extremosas

Nem ama ser algum neste planeta...

Quem não se deixa bulir por arte alguma 

Anda e vegeta, sem viver jamais.

Não mais do que um robô de carne e osso,

Não tem alma nem carrega sentimentos,

É rude e insípido qual pó de asfalto

A voar pelas pistas sem poema e sem canção.


O ABANDONO À ESPERANÇA

 Deixemos de lado toda esperança:

Ainda pensamos como há cem anos,

Ainda amamos os generais e caudilhos

E os influentes senhores feudais.


Esqueçamos os sonhos de dias sublimes

Pejados de paz, felicidade e alegria,

E ergamos nossas taças, brindemos

Ao nada, ao nada, não mais do que ao nada!

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

A AMANTE

 Por que eu não iria embora,

Se cá nós trocamos injúrias,

Com ela é a mais pura luxúria,

E aqui nosso tédio é demais?


Não peça a mim que não vá,

Se a moça se encanta co'a Lua

E quer se banhar das estrelas

E, cálida, vem me beijar.


Por que eu ficaria sem ela,

Que aperta as mãos minhas nas suas,

Cantando uma linda cantiga,

E pisa nas águas do mar?


Tem tanta esperança nos olhos,

No rosto, um sorriso que é luz,

Na cama, delírios frenéticos,

No sono, uma paz sem igual.


Por que deixaria essa moça,

Se volto aos dezoito de idade,

Se sonho qual fosse um menino,

Se agora só entendo de amar?

domingo, 22 de outubro de 2023

NOSTALGIA III

 A juventude acesa, as mil emoções, mil anseios,

Os dias luminosos, o rock e os amores efêmeros 

A funda tristeza dos amores perdidos

E a mais indescritível alegria de viver.


Não tenho jamais a insana, descabida quimera

De desejar minha volta aos vinte de idade,

Mas quero a alacridade das cheias manhãs

E das tardes se abrindo na festa da vida,

Assim como flor desabrochada ao sol claro.

Não quero, não, as assombrações de minh'alma

Em seus gemidos apavorantes, agoureiros e tétricos.

Só busco fazer que a folia dos dias

Adentre inteirinho meu coração desbotado.

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

O MEDO

 O medo envolveu-me de súbito,

E não me consegui libertar.

Falei: "Arreda-te já 

E volta pro fundo das trevas,

Pro inferno de onde vieste!"

Ao que ele me respondeu: "Não venho de canto algum

Nem mesmo surgi do nada:

Não lembras que te sou um pedaço

E moro dentro de ti?"

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

A ARTE

 A Arte é linda como um campo a se adornar de flores várias.

A arte é linda como nudez e como amar em delírio inominável.

A Arte é comovente assim como paixão que traz luz e canto à alma

Ou como simples beijo enternecido de mãe no seu do bebê.



A Arte é santa e doce como cães pueris a nos pedir afagos.

A Arte é elevada e grandiosa como os gestos mais prosaicos,

Quando as almas se purificam e se emprenham de pleno amor.



A Arte é linda como cascatas, como florestas, qual aves muitas em revoadas.

A Arte é sagrada quase qual mares, luares, serras, cerrados, onças, jacus, bujios, antas,  [harpias, os animais.

É majestosa, miraculosa, encantadora e até parece a própria inefável Mãe-Natureza.



O ponto comum e de encontro entre a Arte, o Amor e a Natureza é o Magnífico.



DORMIR

 Já notei seus olhos brandos,

Suplicantes, me chamando:

Vou deitar em nossa cama,

Vou dormir em sua paz.

sábado, 12 de agosto de 2023

A MULHER DESNUDA

 A nudez da mulher é tão linda!

Relevos sublimes ante olhos sedentos,

Rosa se abrindo em pétalas róseas,

Em pétalas rubras ou pétalas púrpuras.

As grotas tão mornas de pura magia,

Caminhos ardentes ao Sétimo Céu.


A mulher desnuda, poesia divina,

Estendida no leito, é linda qual rio

Em campos celestes ornados de cores

Ao canto sublime das vozes de arcanjos.


A mulher despida, cantiga lasciva

Tão cheia de vida, de luz e pulsar.

A mulher que se despe é uma diva que pousa

Na cama suave e a converte num céu.


sábado, 29 de julho de 2023

O IMPÉRIO DO DIABO

 Não sonharei jamais um mundo melhor

Nem nutrirei no velho peito a menor ilusão,

Se as criaturas nada importam se equiparadas ao capital, 

Se o poder, a guerra e o triunfo nas batalhas

Revelam a alma dos homens de forma bem cristalina...


Se os animais sublimes que vemos nos campos

São sempre mortos com crueldade satânica:

Não há beleza alguma nos campos.

Se cada pessoa é solitária ao extremo,

E as cidades, inchadas de gente, são simplesmente desertas.

Se os amores são calculados e tão pragmáticos,

E dos casamentos, então... melhor nem falar.


Se mãos humanas bestiais, tão imundas,

Dão vida a ainda mais cataclismos:

Vendavais, calores, secas, inundações.

Se a ignorância é mensageira e bastião dos malignos

Que semeiam pobreza, miséria, a fome e o caos...

Se a natureza agoniza, encolhida, estuprada

Pela ganância dos vis magnatas.


Cada humano abriga na alma um demônio

--São demônios dos mais variados tamanhos--,

E eu, às vezes, me desolo bem fundo,

Enquanto luto por conter meu diabo

E me furto a mensurar-lhe as dimensões.

sábado, 27 de maio de 2023

MELANCOLIA III


 Se a tristeza me tocou, tão inclemente,

Como dedasse uma ferida viva em sangue

Bem no meio do mais fundo do meu coração...

Se mergulhei no passado mais distante

E lamentei o que foi e aconteceu

Além de tudo o que não houve ou ocorreu...

Se tanto andei dentro de casa como autômato

E me sentei, deitei, silente como um quadro estático

E tão parado como olhar que fita o longe tão somente...

Se me fiz mudo, quedo, quedo com estátua

Em beco escuro, deserto e enegrecido pelo tempo

E não quis sair pelas tão tristes ruas da cidade...

É que nada, nada pode ter razão alguma,

É que a alma em mim se encheu de sombras

E de um canto triste, melancólico, inaudível, 

E pisei no nada, e adentrei o nada, e o nada é dentro deste apartamento

Que dá vista a tudo o que não há, não é, que não existe,

Não se vê, não se encontra nem vislumbra, não se encontra simplesmente.

sábado, 25 de março de 2023

INSPIRAÇÃO

 Hoje acordei com a alma à flor da pele:

Quero sair versejando pelas ruas,

Cantarolando mil  poemas delicados

Qual porcelana,  como pétalas e pássaros

Ou como olhar enamorado de mulher.


Vou contemplar embevecido pelas ruas

Cada cachorro extasiado em pulos vários

E cada gato em seus gestos graciosos.

Irei mirar com olhos comovidos de poeta 

Cada casa singela e seu jardim.


Vou dar-me a ouvir sons de viola e de piano,

Dizer os versos mais bonitos que conheço,

Como se orasse numa fé religiosa,

E me abraçar tão docemente à minha paz.





domingo, 12 de março de 2023

PRECE ODIENTA


 Quem se sente superior a cães e gatos

Ou a qualquer outro animal

É na verdade inferior a qualquer seixo ou verme,

Mas ressalvo que o seixo é mineral

E o verme não tem do mal que faz nenhuma consciência.

Quem se vê melhor que um inocente bicho

É bestial como Nero, Hitler e Calígula

E, cínico e sórdido,  se recusa a aceitar que é verdadeiro

Que a supremacia sobre as outras espécies deste mundo

Não é um direito humano, não, jamais.


Deus, se existis, nunca os perdoeis

E infligi-lhes em dobro o mal que sempre causam

Aos nossos irmãozinhos de patas e focinhos,

Às criaturas das águas, da terra e com escamas.

Uni, meu Deus, os não-demonizados

No combate a tais homens podres, vis.


Castigai-os sem clemência ou piedade,

Condenai-os ao inferno em plena vida 

Destinai-lhes os calabouços, sofrimentos,

Não lhes deis jamais, jamais a paz.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

AS RUAS DA POESIA


 Eu preciso, sim, que os [seresteiros se revezem

Em suas cantigas lamentosas, [doces, cheias de passado,

De saudade, nostalgia, de paixão [e solidão.


Eu preciso sair atrás dos violeiros

Que espalham poesia pelas ruas,

Pelos bares, becos, por jardins e [por pracinhas,

Arrebanhando em seu caminho a [multidão.


 Quero seguir a turba nessa [marcha maviosa

E sair murmurando cantos lindos

Como quem acompanha, [devotado, a procissão.


Quero fios de lágrimas nos olhos [das mulheres;

Quero os homens cheios de ilusões da [adolescência,

A alegria e a tristeza se abraçando

Num sentimental e elevada [comunhão.


Quero ver em cada ser humano [um poeta,

Em cada olhar, uma uma paixão, [pureza romanesca,

Em cada casal, uma entrega [simplesmente transcendente

E a poesia irmanando toda a [gente emocionada,

Em sentimentos tão sublimes e [repletos da mais plena [enlevação.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

"MEU PASTOR"

"Meu pastor, meu bom pastor,

Grande mestre após Jesus, 

Arrefeça-me a aflição:

É que estou desempregado,

Me sustendo dos biscates: 

Se eu doar verba pequena

À igreja de que é líder,

Arderei no fogo eterno?"



Meu pastor, então me explique

De que vale enfim bondade,

Compaixão e caridade,

Ter amor e retidão?

É preciso os predicados,

Mas, sem notas, nada feito?"



"Homem santo, me elucide:

Se doar dinheiro grande,

Eu consigo no futuro

Me tornar um milionário?"



"Meu pastor, meu missionário,

O meu ódio aos que não creem

E aos católicos e espíritas

Não me tornam um ser alto

Ao olhar do Criador?"



"Meu pastor, o seu prestígio

Me terá grande valia.

Meu pastor, não quero muito:

Vida longa, quase eterna,

Com saúde e juventude,

A mais bela das mulheres,

A fortuna dos nababos

E, ao morrer, rumar pro Céu."