sexta-feira, 15 de março de 2024

AUTÔMATO VIL

 As ruas, a poeira e um calor dos infernos.

Tudo é cinzento, incolor ao redor.

Nenhuma moça com um buquê de flores no colo

Nem enxugando, furtiva, lágrimas de perda do amor.

Nenhuma tristeza no meu poema de pedra:

Deus, que foi feito da tristeza dos meus versos?

Quem roubou a verde poesia dos campos?

Os grileiros, incendiários de matas ou os exploradores de gente?

Oi ainda a infalível morte brutal das criações?

O sol ferve todos os chãos, superfícies,

E a compaixão doída aos cachorros das ruas

Parece o único sentimento que tenho no peito.

Os rostos humanos não têm expressão senão arrogância:

Há muito me cansei das pessoas, prenhe de indignação e fastio.

Poderia quem sabe cantar os bares,

Porém minha poesia saiu do bar,

Que não é mais a síntese das coisas do mundo

E carece do encéfalo e do encanto de outrora.

Nada é música, mas sons de ferro batendo,

O tédio inefável alonga as distância que percorro

E transforma os minutos em horas infindas.

Vivo num mundo cinzento, onde nada é alegre nem triste,

E me vejo também feito de pedra e cimento,

E sigo, autômato vil, pelas ruas da vida.

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