Preciso da calma da noite
pra me ocupar dos enlevos que venham
e que encham minh'alma de lira,
antes que o dia amanheça
que os feios ruídos dos carros
me tragam um humor dos infernos.
Preciso me ater ao que toca
meu peito tão pobre de chama,
antes que acorde a cidade,
que o meu desprezo aos humanos
conduza à perversa vontade
de incendiar ponta a ponta o planeta.
Preciso fechar os meus olhos,
cultivar o que é doce pureza,
antes que eu lembre da vida
e que o verbo rascante que tenho
salpique as ruas cinzentas
da desesperança incontida.
Destilar a ternura infinita
no afago amoroso e paterno
no dorso da minha cadela,
antes que os ódios que sinto
despertem qual fossem tsunâmis
e tragam-me ao peito um infarto.
Preciso de tempo e motivos
pr'amar como fora um simplório,
contemplar como fora um poeta,
pra não mais nutrir o desejo
de me isolar bem longe, em Saturno
e de lá nunca mais retornar.
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