Eu morava na esquina da rua Tomás Lopes com a rua Helvétia,
A rua Helvétia era intransitável para os carros
E servia por isto, para nós, meninos, toda tarde de campo de futebol.
Ambas as ruas eram descalças e mal-iluinadas,
E nós, meninos, toda noite brincávamos de pique por ali.
“Pique-tá”, “pique-ajuda”, “carniça”, “pique-esconde”, “pique-bandeira”,
E a gritaria e a correria alvoroçavam as noites.
Eu não conhecia ainda o caráter humano e o ódio.
Éramos todos crianças pobres, e a simplicidade das nossas casas e das nossas vidas era doce
[ e romântica.
Quase toda noite passava uma lindeza de moça adulta (tinha lá seus dezoito anos) que me
[ beijava no rosto,
E aquele beijo era como uma dádiva dos céus.
Era como se aquela diva fosse a própria Vênus e, despida e lúbrica, a mim se entregasse.
Era tão bom sonhar!... Era paraíso e era volúpia.
Algumas noites a meninada se reunia sentada no muro de minha casa,
E ficávamos contar histórias de assombrações:
Era tão bom sentir medo...!
Eu era feliz como um potro solto na várzea
E não conhecia ainda o desgosto e a dor.
Eu vivia a mais bela poesia...
Deus(!), eu vivia a mais aprazível poesia.
Como dói em mim a saudade!
Eu acreditava nos santos protetores,
Eu acreditava em Deus e nos homens.
Eu acreditava na vida e era puro sonho e pura esperança;
Eu acreditava num amanhã ainda mais feliz do que aqueles dias.
Eu não tinha este gosto amargo entranhado na língua da alma.
Eu não tinha este tédio, este cansaço, esta náusea das coisas.
Eu era menino, puro, simples, inocente:
Eu era um anjo que me deliciava das maravilhas do Éden.
1995
"PÉS NO CHÃO E POESIA" tem esse título porque em primeira análise minha poesia é incrédula, mas reúne poemas que às vezes se antagonizam pelo fato de alguns se pejarem da crueza calcada na realidade dos dias, enquanto outros têm a doçura dos anseios da meninice, além dos que encaram a dureza do cotidiano num protesto contra ela ou mesmo numa linguagem lírica que tenta cobri-la com adorno poético. Acesse meu canal no Youtube: https://youtube.com/@demostenesbaraodamata880?si=l1cgAhBMX48XRGYU
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domingo, 30 de setembro de 2007
O SENTIMENTO SUBLIME
O sentimento sublime que trago em meu meu candente é como se tudo florasse, se a aurora fosse constante e a noite, tão linda de estrelas, ...
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Vem, mulher, pra mim, que eu te faço Uns versos tão mansinhos e cálidos, Que, mais do que musa, Vênus te sentirás. Vem pra mim por inte...
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Quero fazer um poema que seja só não-amor. Que não seja canto, mas silêncio; que não seja perdão, mas ódio calado, velado e mudo. Qu...
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Quero te fazer um poema co’a delicadeza de quem toca harpa, Co’a mansidão de quem dedilha violão. Quero versejar para ti assim como quem t...