domingo, 30 de setembro de 2007

A TODO AQUELE QUE NUTRE UM DESEJO, POR MENOR QUE SEJA, DE MORRER

Não, amigo – besteira! – não morra: A vida é tão dinâmica, tão cheia de fatos, Tão cheia de gente, tão cheia de cores, tão cheia de vida, Que, indiferente a você, seguirá seu curso. Que diabos de prazeres idiotas você quer para si? Terá de se contentar com os enfados de um velório, As lágrimas sentidas dos entes mais próximos E dos amigos aturar insinceros elogios Com lugares-comuns de péssimo gosto Murmurados à sua família, ante seu caixão. Sem falar as ordinárias anedotas sobre defuntos Em que eles o incluirão, quando, enfim livres de sua cerimônia funérea, Reunirem-se no primeiro botequim. Não seja tolo, amigo, não morra. Será lembrado apenas por aqueles raros que de fato o amam, Mas que – ora bolas! – não podem ficar a vida inteira Chorando você. Os outros somente muito de quando em quando É que de você se lembrarão. E a sua mulher ou, se for o caso, as suas mulheres Encontrarão logo, logo, cada qual o devido consolo Nos braços de um sujeitinho qualquer . Não, meu amigo, por que morrer? De que vale um bom necrológio, um enterro de arromba, Uma missa das boas, dar nome a uma rua, Se do prazer da carne não poderá mais desfrutar? De que adianta ser um defunto famoso Ou mesmo chorado e lembrado por muitos, Se das cores, das luzes, da alegria da vida Estará tão distante, simplesmente ausente? Não, meu caro, não queira morrer. Há tão belas mulheres de formas lascivas; É tão bom ir ao bar para rir e falar; São tão lindas as músicas, envolventes as ruas Repletas de gente, vitrines e sol. 1994